Cobertura de Show – Rock Concha – dia 1
Por Lucas Rocha e Rogério Pinheiro
O Rock Concha completa 30 anos. E, para comemorar, nada mais apropriado do que uma volta a esse templo de excelentes histórias e shows na capital baiana. Desta feita, o festival é realizado em dois dias, 13 e 14 de julho, com bandas locais também, divididas em: dia 13 – Drearylands e Malefactor, representantes locais; Ratos de Porão e Camisa de Vênus. Dia 14 com Alquímea e Pedro Pondé, soteropolitanas, além do Planet Hemp para fechar o festival. Pois bem, vamos ao primeiro dia.
O tempo um pouco carregado e o receio da chuva fizeram com que o público fosse chegando bem timidamente a concha. Marcado para às 17h, e somente apenas vinte minutos após o planejado, sobe ao palco a local Drearylands. Comemorando 20 anos de carreira, a banda soteropolitana traz seu heavy Metal tradicional com claras influências melancólicas nas letras e nas linhas de guitarras, tem Leonardo “Lion” Leão como principal compositor. Para começar o set, uma clássica: Sailors of the Argo, do primeiro trabalho e cativando os presentes que conheciam e – também – estavam ali pela banda. Na sequência, e com o público realmente chegando, vem Addiction To War, já do segundo registro oficial da banda – chamado Heliopolis… – mostrando que o grupo está em forma após mais uma volta aos palcos após hiato. Após esse show de riffs e combinações de guitarras que evidenciam o entrosamento e o trabalho maravilhoso de Syade e Páris, Efígie – novo clipe e single – dá continuidade a apresentação do quinteto na concha. Essa é a primeira música completamente em português do show, para mostrar que, de fato, o conjunto estabelece uma tendência de futuro, já que diversas bandas nacionais – mais e mais – vem compondo e preferindo a língua portuguesa como exposição de seus trabalhos. Incerto Adeus, mais uma completamente em português e do último registro mais extenso No Poetry Lasts, é uma do estilo de composição clássica do grupo, com início melodioso e explosão de guitarras e vocais rasgados na sequência, agradando com o peso e com trechos simplesmente grudentos na memória e que, sonoramente, funcionou muito bem ao vivo. A essa altura com o local parcialmente cheio, Redemption traz o peso que o grupo pode estabelecer ao vivo, além de um riffs marcantes e excelente trabalho de Marcos no baixo. Para fechar esse memorável registro ao vivo, Em Frente ao Espelho, que já é um clássico da banda e cantada em uníssono pela plateia que conhece de perto o trabalho cuidadoso e bem estruturado desse grupo, foi tocada por Louis na bateria, voltando, aos poucos, de um afastamento por conta de saúde. Começar assim só perspectivava uma noite excelente para o festival.
Sem muita demora, seguindo os ritos de um evento com muitas bandas, sobe ao palco a Malefactor, ainda divulgando seu mais recente trabalho e o primeiro com nova formação descartando os teclados, Sixth Legion, que traz também Lord Vlad – vocalista – também no baixo e a chegada de Daniel Falcão para bateria. Formação essa que, ao vivo, segundo os fãs, já foi mais do que testada e aprovada, portanto, gerando expectativa para esse set ao vivo na concha após alguns anos sem shows nesse templo baiano. Após intro, Counting the Corpses soa poderosa no momento que – até agora – o espaço tem mais pessoas. Primeiro registro do último álbum, traz a atmosfera de caos que a banda tem costume de gerar nos shows. A sequência traz clássico Necrolust in Thulsa Abbey, do segundo registro em estúdio da banda, que marca pelos riffs e trabalho de guitarras de Danilo e Jafet. A impressão que se tem até agora é de que se trata de uma banda que tem realmente mais de 25 anos de estrada. Centurian chega com seu refrão poderoso e marcante vocal de Vlad que continua sendo uma das melhores vozes ao vivo do metal nacional, impressionando àqueles que, porventura, ainda não tivessem ainda acompanhando uma apresentação do – agora – quarteto local ao vivo. Talvez esse tenha sido o pico até o momento, pois, até agora, o espaço não esteve tão cheio. O tempo deu trégua, já fazia certo calor, e agora Sodom and Gomorrah – primeiro single e clipe do último álbum – eco seu poder pela concha. Música mais forte para plateia, envolveu o espaço e já traz a sensação forte de resultado positivo. O telão mostrava o apuro do trabalho feito no clipe, enquanto bangers não sabiam se batiam a cabeça ou contemplavam o vídeo projetado no palco. Momento alto da apresentação. Para fechar, a épica Elizabathory, do penúltimo disco: Anvil of Crom. Com início marcante, já se tornou canção obrigatória no set e com local de destaque, sempre. Final empolgante e magnético para um dos grupos que vive melhor momento no Brasil. Na primeira parte, precisamos dizer que as bandas baianas continuam mantendo um nível de quem pode se orgulhar do que esses caras ainda continuam fazendo no país. Vida longa, Drearylands e Malefactor!
Havia chegado o momento mais esperado da noite para maioria dos presentes: as bandas headliners. Todos estavam à espera da lenda do punk nacional, talvez uma das bandas mais carismáticas de todos os tempos, e num momento política tão conturbado, sem demora, chegava o Ratos de Porão a todo vapor. E eis que aparece a capa do Brasil – um dos mais cultuados discos da banda – aparece no telão e todos sabem o que está por vir. Com a Concha já lotada, o público vai à loucura quando percebe que o RDP não veio para brincar, pois já começam com Amazônia Nunca Mais. A banda aparenta estar mais coesa do que nunca, mostrando uma maturidade musical incrível, com todos os integrantes muito bem à vontade no palco. Continuam com Retrocesso e com o público cantando em uníssono, empolgados com a volta do Ratos aos palcos de Salvador. Seguindo a ordem do álbum, tocam Aids, Pop, Repressão e Lei do Silêncio, sempre com muita agressividade sonora, sobretudo nas guitarras de Jão, e muita empolgação. O show continua com S.O.S. País Falido com Boka e Juninho representando uma cozinha de respeito. No fim da música, o coro da plateia presenteia o atual presidente do país com um trocadilho comum ao se agredir governantes. Coro endossado por João Gordo que, por sinal, apesar de visivelmente debilitado, segurou a onda do show muito bem até o momento. Ainda tocam Gil Goma e Beber Até Morrer, novamente cantada por todos os presentes. Em seguida, Plano Furado II que demonstra que o álbum Brasil – lançado em 1989 – está mais atual do que nunca; afinal, “o sistema monetário sempre muda pra pior, o pobre fica bem mais pobre e o rico vai pra melhor”. A banda continua o show com uma porrada atrás da outra, Heroína Suicida… Crianças Sem Futuro… Farsa Nacionalista… e, até mesmo, Traidor. A pegada e a empolgação da banda são incríveis, fazendo com que o público ficasse em êxtase. Somente após Porcos Sanguinários, João informa que havia se curado recentemente de uma pneumonia e parou por alguns instantes para respirar. Incrível que, mesmo ainda estando debilitado, ele conseguiu se manter durante 50 minutos de show. Agora, é anunciada pela própria banda o Melô do Bolsominion, mais conhecida como Vida Animal. Máquina Militar e Terra do Carnaval dão sequência ao show, até que se tem uma pequena pausa para a banda beber uma água enquanto o som mecânico toca Se Gritar Pega Ladrão, do saudoso Bezerra da Silva. Mudando de álbum, a banda vai para o Crucificados pelo Sistema e finaliza o show com outros três clássicos, dessa vez Morrer, FMI e a faixa que dá nome ao álbum, Crucificados pelo Sistema. Enquanto a banda deixa o palco, no som mecânico eis que toca Brasileirinho de Waldir Azevedo. Show espetacular e papel cumprido pelo RDP, que fez mais um show memorável na terrinha.
Para encerrar essa – definitivamente – grande noite, subia ao palco a carismática e marcante Camisa de Vênus, ainda divulgando seu novo CD/DVD intitulado Dançando em Porto Alegre, que desde 2016 não tocavam em terras baianas. A introdução arrasta logo o grito característico dos fãs do Camisa que é “Bota pra fuder”. Hoje e Bete morreu se seguem com fãs já exaustos, porém extasiados pela tarde/noite de rock na essência na Concha Acústica de Salvador. Marcelo Nova sempre à frente com muita incisão as interpretações. Banda coesa, formação nova, porém bem marcada na estrutura das músicas, sobretudo as antigas. Na sequência, destacam-se Deus me dê grana, com excelente performance de guitarras, que agora contam com a presença de Drake Nova e Leandro Dalle. O lendário Robério Santana no baixo e Célio Glouster completam a formação que demonstra estar completamente em forma para construir momentos potentes ao vivo e fazer diversos fãs relembrar deveras a década de oitenta. Com presença, vem o medley Quem é Você?, Cidade Fantasma e Gotham City. Excelente participação do público na cantoria da música. O telão exibia – de lado a lado – a logo da banda com efeitos enquanto tocavam, O som, ensurdecedor, marcava a presença dos “camisados”. Para finalizar, com destaque, a apresentação, My Way traria a esperada cover, também Silvia, Simca Chambord e O Ponteiro Tá Subindo, além d mais do que clássica Eu Não Matei Joana D’arc mostram o quanto o Camisa continua relevante num cenário “estranho” do Rock nacional. Somente quando colocamos estas bandas ao vivo é possível ver o que – de fato – rock ou não é. Estas bandas, hoje, apenas ratificaram seus compromissos com Metal/Rock e fizeram do festival, na sua primeira noite, linda e importante. No dia seguinte teve mais. E, esperamos, ano que vem também.