Review – Álbum – Pitty – Matriz
“Eu preciso falar dessa nossa verdade que vem do Nordeste” e que também estampa os jornais do nosso Brasil: Assim nasce o novo álbum de Pitty, Matriz. Essencialmente uma crítica política e social, recheada de melodias nostálgicas e refrãos avassaladores.
Matriz se torna um marco para a divisão de águas dos fãs de Pitty. As faixas do álbum apresentam uma visão politicamente (in)correta, com metáforas agressivas que soam particularmente familiar, se levarmos em conta a situação atual do nosso país.
O título do álbum já especifica a ideia central, ser uma matriz, um ponto de origem que possa trazer a essência da Bahia, junto com sua cultura e tradições. Então, nada mais justo do que acrescentar elementos como Lazzu Matumbi, Larissa Luz e BaianaSystem, que enriquecem essa mistura única que é a nossa música.
Contando com 13 faixas, sendo 11 canções e 2 vinhetas, esse é o 5º álbum de estúdio de Pitty. Ao entrar nesse mundo, somos apresentados a uma rica descrição da cultura baiana, da vida soteropolitana e da religião. Os elementos como atabaques e abê são incorporados em uma mistura sinestésica, apresentando o mundo do candomblé e trazendo o sincretismo e a devoção aos orixás e a Jah, na religião rastafari – destacando inclusive a capa do álbum com a fotografia incrível de Otávio Souza e design gráfico de Pedro Hansen.
O rock, marca registrada de Pitty, vem mesclado com tons de reggae, afoxé e o Ska Rap (e arrisco dizer até arrocha) que, sem medo de arriscar, explora novas sonoridades. Essa é uma mistura que deu certo e, assim como o dendê, impregna e não sai mais da mente. Aqui há baladas, como por exemplo “Motor” (versão da música de Maglore) e “Bahia Blues”, que traz uma descrição detalhada da cidade de Salvador, celebrando suas origens e valorizando a simplicidade da vida. Porém também presenteia o fã raiz com hardcore e o punk rock.
Os hits de divulgação inicial são “Noite Inteira” e “Te conecta”. Escolha audaz, porém acertada para a promoção do álbum e do “Tour Matriz”, que foi iniciada em 2018. Com letras fortes, aqui é necessário atenção aos detalhes e por isso, se você ainda não escutou essas faixas, pare o que está fazendo agora e confira!
A resistência de ‘Noite Inteira’:
O hit não apenas inicia o álbum (segunda faixa), mas abre a cabeça do ouvinte. “Noite inteira” usa metáforas para atingir um ponto crítico social, e porque não também patriota, quando questiona que tipo de cidadão é você (por favor, não responda “de bem”).
A que se deve a insegurança e temor que sentimos hoje? É uma “guerra sem quartel”, é “gente que se junta pra falar besteira”… Nesse embate de valores, o poder sugestivo aparece para definir se você “se junta pra fazer revolução” ou não. Esse single foi lançado em 20 de março em meio ao caos político do país. Não é à toa que a visibilidade que essa música trás gera inconformidade por parte daqueles que não se sentem representados: “Não peço que concorde, não impeça que eu fale. Entendo que discorde, não espere que eu me cale”.
Seria então muita surreal pensar que “a rua é pra a vida inteira” é aquela que foi destruída e que talvez nem mais exista fisicamente (enxergo aqui Marielle Franco)? Ou que a bandeira que nunca seria vermelha “quando ele pulsa, ela sangra vermelha”? Ficam aqui os questionamentos, porque afinal de contas, “Respeite a existência, ou espere resistência”.
Matriz é uma surpresa gratificante, audaciosa, que agrega e inova. Pitty mantém sua consistência sonora, trazendo elementos enriquecedores e participações representativas da cultura baiana. Ela explora novas sonoridades e une uma crítica política voraz à uma experiência sinestésica surpreendente, mostrando que depois de todos esses anos ela não é mais apenas a ‘princesa do rock’ baiano, ela é a dona da porra toda!